NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DAS IFRS E A PARTICIPAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL NO PROCESSO DE CONVERGÊNCIA CONTÁBIL

14/03/2016 19:36

[1]José Carlos de Jesus

 

Com o crescente impacto da globalização no mercado brasileiro, surgiu a necessidade de empresas nacionais buscarem recursos financeiros internacionais de segmentos similares em todo o mundo (CRC-RS, 2010). Isso também fez com que, as Normas Brasileiras de Contabilidade Convergissem para as Normas Contábeis Internacionais. Nesse sentido Marques (2010, p.46) acredita que:

 A globalização dos negócios, no que diz respeito ao mercado de capitais e o crescimento dos investimentos diretos estrangeiros somados à formação de blocos econômicos traz consigo a necessidade de se ter um conjunto de normas contábeis internacionais que viabilizem a comparação de informações entre companhias de um mesmo grupo ou de grupos distintos.

Deste modo, avalia-se que não é possível mercados se expandirem sem uma troca de informações condizentes com a realidade de cada instituição, ou seja, um patrimônio deve ser avaliado no Brasil do mesmo modo com que seria avaliado em outro país, resguardados às suas limitações. Afirma-se que ao adotar os IFRS, o principal benefício percebido por uma empresa é que suas demonstrações contábeis se tornem confiáveis na percepção dos investidores e de credores.

Todavia, percebe-se que nos últimos anos, pôde-se acompanhar na mídia que o Brasil é um país emergente e que está crescendo mais e mais a cada ano. Com isso, investidores do mundo todo passaram a ter interesse em empresas do nosso país”. Esses fatores paralelos outros de ordem econômica, política e social pressionaram para uma mudanças nas normas contábeis de modo a direcionar o Brasil uma sintonia mais próxima com o resto do mundo.

Vale complementar que “se a empresa tiver de preparar suas demonstrações contábeis de acordo com diferentes normas de distintos países para se comunicar com investidores nos vários mercados de capitais em que opera, terá com isso elevados custos e dificuldade no processo de comunicação.” (PADOVEZE; BENEDICTO e LEITE, p.09, 2011). Outro fato a discorrer é sobre:

O mercado de capitais dos países que adotam normas contábeis em consonância com as reconhecidas internacionalmente, do nosso ponto de vista, tende a estar em vantagem em relação aos demais, visto que os investidores estrangeiros necessitam de informações confiáveis que resguardem a comparabilidade das informações no processo de tomada de decisões. (PADOVEZE; BENEDICTO e LEITE, p.09, 2011)

 

Diante disso, em 28 de dezembro de 2007, foi decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República do Brasil a Lei 11.638/07, onde se deu início ao processo de harmonização da legislação contábil brasileira que entrou em vigor em primeiro de janeiro de 2008. Alterando e revogando dispositivos da Lei nº 6.404 de 15 de dezembro de 1976 e da Lei nº 6.385 de 7 de dezembro de 1976, estendendo-se às sociedades de grande porte disposições relativas à elaboração e divulgação de demonstrações financeiras. Essa Lei então alterou os artigos 176 a 179, 181 a 184, 187, 188, 197, 199, 226 e 248 da Lei º 6.404 de 15 de dezembro de 1976. (PLANALTO.GOV.BR, 2007).

Deste modo, é relevante destacar resumidamente as principais alterações sofridas na contabilidade:

a)      Substituição Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos (DOAR), pela Demonstração do Fluxo de Caixa e criação da Demonstração do Valor Adicionado, conforme art. 176.

b)      Divisão de dois novos grupos de contas de acordo com o art 178, ou seja, Ativo Permanente dividido em investimentos, imobilizado, intangível e diferido. Enquanto que o Patrimônio Líquido ficou dividido em Capital Social, Reservas de Capital, Ajustes de Avaliação Patrimonial, Reservas de Lucros, Ações em Tesouraria e Prejuízos Acumulados.

c)      Alteração no critério de avaliação de coligadas, art. 248, descreve que no “no balanço patrimonial da companhia, os investimentos em coligadas sobre cuja administração tenha influência significativa, ou de que participe com 20% (vinte por cento) ou mais do capital votante, em controladas e em outras sociedades que façam parte de um mesmo grupo ou estejam sob controle comum serão avaliados pelo método da equivalência patrimonial...”

d)     Criação de Reservas de Incentivos Fiscais, aonde a contabilização é realizada diretamente no resultado do exercício conforme art. 195. Um ponto importante a salientar é que antes da criação da Lei 11.638/07 os benefícios fiscais concedidos pelo governo eram contabilizados na conta de reserva de capital que são contribuições recebidas dos proprietários ou de terceiros que não representam receitas ou ganhos e que, portanto não devem transitar por contas de resultado exemplos: ágio na emissão de ações, incentivos fiscais, correção monetária do capital realizado.

e)      Introdução do conceito de Ajuste a Valor Presente para as operações ativas e passivas de longo prazo e para as relevantes de curto prazo, art. 183, VII e art. 184, III.

f)       Estabelecimento de novas regras para reservas de reavaliação, conforme determinação do art. 6, aonde os saldos existentes nas reservas de reavaliação deverão ser mantidos até sua efetiva realização.

 

Dando continuidade ao processo de convergência, em 27 de Maio de 2009 foi convertida a Medida Provisória nº 449/08 na Lei 11.941/09 que complementou algumas informações na Lei da S.A’s, como a extinção do ativo diferido e do resultado de exercícios futuros e outras. (IUDÍCIBUS et al, 2010). Houve um ponto relevante nesta alteração no sentido de desvinculação da contabilidade praticada no Brasil sem a influência de atos de natureza fiscal, ou seja, “foi a formalização, agora do ponto de vista tributário, e não societário, da desvinculação entre o FISCO e Contabilidade, com a criação do Regime Transitório de Tributação (RTT).” (IUDÍCIBUS et al, 2010, p. 21).

Entretanto, esta a Lei 11.941/09 também alterou a Legislação Tributária Federal relativa ao parcelamento ordinário de débitos tributários, dentre outras modificações. Porém, manteve a maior parte dos dispositivos originalmente previstos na MP 449/08. (TRENCH, ROSSI e WATANABE ADVOGADOS, 2009). Nessa fase, pode-se dizer que a grande novidade foi a implantação do RTT. Em resumo o RTT trata dos ajustes tributários decorrentes dos novos métodos e critérios contábeis introduzidos pela Lei 11.638/07 e pelos artigos 37 e 38 da Lei 11.941/09, ou seja, visa neutralizar os efeitos das alterações contábeis introduzidas por estas Leis.

Nesse cenário, com o objetivo de estudar e preparar a emissão de Pronunciamentos Técnicos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza foi criado em 07 de outubro pela Resolução do CFC Nº 1.055/05 o CPC. Esse órgão visa à centralização e uniformização do processo de informações contábeis levando em conta a convergência da contabilidade brasileira aos padrões internacionais. Sendo o único órgão responsável pela emissão dos pronunciamentos contábeis no Brasil. Sendo criado em função das necessidades de:

a)      - convergência internacional das normas contábeis (redução de custo de elaboração de relatórios contábeis, redução de riscos e custo nas análises e decisões, redução de custo de capital);

b)      - centralização na emissão de normas dessa natureza (no Brasil, diversas entidades o fazem);

c)      - representação e processo democráticos na produção dessas informações (produtores da informação contábil, auditor, usuário, intermediário, academia, governo).

Vale ressaltar que antes da criação do CPC as normas, procedimentos técnicos, orientações e interpretações contábeis eram de responsabilidade do Conselho Federal de Contabilidade e da Comissão de Valores Mobiliários – CVM, no caso das companhias abertas. Salientando também que o IBRACON, o Banco Central, a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) e a Receita Federal também eram agentes legalmente autorizados, cada um na sua respectiva competência.

      Deste modo, estabeleceram-se características básicas do CPC como:

a)      Autonomia das entidades representadas;

b)      Estrutura necessária fornecida pelo Conselho Federal de Contabilidade - CFC;

c)      Composta pelo ABRASCA, APIMEC Nacional, BOVESPA, Conselho Federal de Contabilidade, FIPECAFI e IBRACON;

d)     Dos membros do CPC, dois por entidade não auferem remuneração.

Além disso, serão sempre convidados em suas reuniões, além de seus membros atuais, representantes do Banco Central do Brasil, Comissão de Valores Mobiliários – CVM, Secretaria da Receita Federal e da Superintendência de Seguros Privados – SUSEP.

Considerando a relevância das informações contábeis no processo de tomada de decisão, é inevitável dizer que a qualidade dessas informações refletem diretamente na gestão das empresas. Todavia, destaca-se que a transparência e a confiabilidade são componentes essenciais na análise dos negócios e da realidade das entidades. Assim, na harmonização da contabilidade haverá discussões mais aprofundadas sobre os conceitos utilizados, maior confiabilidade de investidores internos e externos, redução dos custos de ajustes de divergências de critérios contábeis, facilidade de intercâmbio técnico profissional e facilidade no processo de harmonização com as normas fiscais, dentre outros.

Nesse caso, alega-se que entidades que estão disputando mercado em alto nível, ou seja, as grandes companhias e as potenciais como as pequenas e médias empresas, almejarão cada vez mais trazer para perto de si recursos necessários para o seu crescimento. Essa busca poderá ser dada mediante investidores, que por meio das demonstrações contábeis transparentes e informações confiáveis farão com que deem credibilidade ao negócio que lhes mais convier. Portanto, realça-se que a ascensão econômica do Brasil será consolidada quando o mundo puder olhar para “ressonância magnética” financeira do país e entendê-la comparando-a com as de seu próprio território, reduzindo custos de conversão de demonstrações e reinvestindo este capital em outros negócios.

Em resumo, acredita-se que o Brasil esteja seguindo a tendência mundial. Tendo em vista que o padrão IFRS é adotado, atualmente, por cerca de 110 países e, aproximadamente, por 100 milhões de pequenas e médias empresas no mundo. (BNDES, S/D). O BNDES (S/D) ressalta ainda que “a adoção do IFRS para as PMES resultará na migração de uma situação de informalidade para um padrão de transparência contábil de alto nível.” 

A Receita Federal do Brasil foi criada em 1968, no qual foi instituída pelo Decreto 63.659/68 em substituição à antiga Direção-Geral da Fazenda Nacional. Surgida da necessidade de modernizar o sistema de arrecadação e fiscalização de tributos, bem como promover uma maior integração entre fisco e contribuinte. Com isso, houve um aumento da arrecadação no final dos anos 60, enquanto que a participação da carga tributária no PIB, nessa época, passou de 18% para 24% do PIB. (Secretaria da Receita Federal, s/d)

Porém, nesta década, o Brasil passava por sérias turbulências na economia, podendo ser atribuída a alguns fatores como:

Os efeitos das medidas de estabilização aplicadas naquele período; o espaço de tempo transcorrido antes que os efeitos das reformas institucionais realizadas no sistema financeiro pudessem ser sentidos e antes que os numerosos estudos e planos de expansão da infra-estrutura e das indústrias pesadas do país pudessem resultar em atividades de construção efetivas; e, finalmente, o intervalo de tempo necessário para convencer os investidores internos e estrangeiros, privados e oficiais, da estabilidade do novo regime e de seu controle sobre a economia. (BAER, p. 96, 2002)

 

Deste modo, observa-se que a preocupação do Poder Público com a aparência da economia do Brasil, ou de qualquer país, estava demonstrada neste período, e sempre foi assim, desde o início da civilização mercantil. Via de regra, acredita-se que um país, assim como uma entidade, está a todo o momento se relacionando com o ambiente externo. De maneira que a preocupação com o comportamento da dos principais agentes que afetam a economia deve ser atividade de constante vigia.

Nesse cenário surge o questionamento quanto à participação do Estado, representado pela Receita Federal do Brasil, no que tange o processo de Convergência Contábil às Normas Internacionais. Pois reflete-se sobre o gênero dessa participação no sentido de entender se ela é passiva ou ativa, ou se está totalmente engajada nesse processo. Uma vez que, este assunto trata-se de matéria de seu interesse e talvez uma participação de maior evidência trouxesse de repente outro foco para algumas questões pouco abordadas.

Todavia, sabe-se que para compor a estrutura do Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC são convidados representantes da SRF, SUSEP, CVM e BACEN, além de outras entidades e especialistas. No entanto, estes “convidados”, segundo Regimento Interno do CPC, terão direito a voz, mas não a voto. Sendo assim, discute-se o motivo pelo o qual, a sociedade, mais especificamente, os interessados em negócios e contabilidade, se contentaram somente com a criação do RTT (Regime Tributário de Transição), que ao que se percebe, resumiu a participação da RFB. Salientando a grande contribuição e o enorme avanço promovido pela mesma, no que tange a inserção da alta tecnologia nos processos de arrecadação e fiscalização de tributos nos últimos anos com a criação do SPED, FCONT, Nfe, dentre outros. Sabe-se, porém que, mudança é contábil e não fiscal. Mas alguém já parou para pensar se é realmente isso que ocorre na prática?

O Brasil já pertence ao grupo de mais de cem países que adotaram o padrão IFRS. Com a evolução da ciência contábil ao longo dos anos, principalmente nos dias atuais, a necessidade de um órgão que fiscalize a aplicação dos procedimentos e normas contábeis se torna evidente, a ponto de se tornar gritante. Todavia, existem órgãos fiscalizadores considerados “informais”, ou seja, aqueles que por determinação situação ou necessidade acabam analisando a aplicabilidade destas Normas, como, por exemplo, as auditorias independentes. Porém, no contraponto, imagina-se que se existisse tal órgão, o trabalho das auditorias não teria validade nenhuma, uma vez que, estas demonstrações já estariam em conformidade com a Legislação Contábil após estarem submetidas ao suposto órgão. No entanto, ressalta-se que nem todas as empresas têm obrigação ou condição de submeterem suas demonstrações a um processo de auditoria independente, seja pelo seu custo ou desobrigação.

 

 

BIBLIOGRAFIA

BAER, Werner, A Economia Brasileira, 2ª ed., São Paulo: Nobel, 2002.

IUDICIBUS, Sérgio; MARTINS, Eliseu; GELBCKE, Ernesto Rubens. Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações: aplicável às demais sociedades. São Paulo: Atlas, 2010.

MARQUES, Wagner Luiz, Contabilidade Geral – 1 Segundo a Lei 11638/2007 das Sociedades Anônimas, Passo a Passo da Contabilidade, 1ª ed, Paraná: Gráfica Vera Cruz, 2010.

PADOVEZE, Clóvis Luís, BENEDICTO, Gideon Carvalho De, LEITE, Joubert da Silva Jerônimo, Manual de Contabilidade Internacional, IFRS – US Gaap – BR Gaap, Teoria e Prática, 1ª ed., São Paulo: Cengage Learning, 2011.

PLANALTO.GOV, Disponível em  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm, acesso em 30/07/2013.

RECEITA FEDERAL, Disponível em https://www.receita.fazenda.gov.br/, Acesso em 30/07/2013.

SUL, Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul, Princípios de Contabilidade e Normas Brasileiras de Contabilidade, Revista ed., Porto Alegre: 2010.

TRENCH, ROSSI e WATANABE ADVOGADOS, Disponível em, https://www.trenchrossiewatanabe.com.br/alertas/7_AL_Tax_Jun09.pdf, acesso em 30/07/2013.



[1] José Carlos de Jesus: Bacharel em Ciências Contábeis – Faculdade da Serra Gaúcha, Pós Graduando em Finanças Corporativas – Universidade de Caxias do Sul, Membro do Centro de Estudos Científicos em Contabilidade FSG. Email – jpardim85@hotmail.com